Investir em ETFs domiciliados nos Estados Unidos implica em sofrer retenção de 30% sobre dividendos pagos por empresas americanas. Esse impacto não recai apenas sobre o investidor pessoa física que aplica diretamente no exterior, mas também sobre ETFs brasileiros que compram esses veículos americanos. Em outras palavras, tanto pessoas físicas quanto jurídicas acabam perdendo o mesmo pedaço dos dividendos na fonte americana.
Na prática, de cada 100 dólares distribuídos em dividendos pelas companhias, apenas 70 são reinvestidos quando a exposição é feita via ETFs americanos. Já ETFs domiciliados na Irlanda contam com tratado tributário que reduz essa retenção para 15%, elevando o reinvestimento líquido para 85 dólares. Em um índice que distribui em média 2% ao ano em dividendos, essa diferença equivale a um ganho adicional de cerca de 0,30% ao ano em retorno líquido — e quando acumulada ao longo de décadas, gera impacto expressivo no resultado final.
UCITS (Undertakings for Collective Investment in Transferable Securities) é a principal estrutura regulatória de fundos e ETFs na União Europeia. Criada nos anos 1980, ela estabelece regras rígidas de diversificação, transparência e proteção ao investidor. É, na prática, o “padrão ouro” europeu para fundos de investimento, equivalente em robustez regulatória ao que a SEC representa nos EUA.
Para o investidor, isso significa que um ETF UCITS segue normas de governança claras, auditoria independente e limites de concentração que reforçam a segurança da aplicação. Além disso, a estrutura UCITS permite o chamado “passaporte europeu”: um fundo criado em países como Irlanda ou Luxemburgo pode ser distribuído em toda a União Europeia, aumentando a escala, liquidez e acesso global.
Ou seja, ao comprar um ETF UCITS que replica um índice como o S&P 500, por exemplo, o investidor não está abrindo mão de segurança em relação a um ETF americano. Pelo contrário: tem acesso a uma estrutura igualmente sólida, com a vantagem tributária que só a Irlanda oferece sobre dividendos de ações americanas.
Se a Irlanda é o “como” mais eficiente, o S&P 500 é o “quê” que faz tanto sentido na carteira de longo prazo. Criado em 1957, o índice reúne as 500 maiores empresas listadas nos EUA, responsáveis por mais de 80% do valor de mercado da bolsa americana, por isso é amplamente considerado o melhor termômetro do mercado acionário dos EUA. Ele não é estático: a composição muda ao longo do tempo, acompanhando a transformação da economia.
Décadas atrás, as maiores posições estavam em empresas industriais e de energia, como General Electric e Exxon. Hoje, o índice reflete o domínio das big techs — Apple, Microsoft, Alphabet, Amazon e Nvidia — que juntas já representam mais de 30% do total. Essa capacidade de adaptação garante que o S&P 500 permaneça sempre alinhado às forças econômicas mais relevantes do mundo.
Fonte: Goldman Sachs Global Research. Data base: 31/12/2024.
Além da representatividade, a construção do S&P 500 contribui para sua qualidade: ele mantém critérios de elegibilidade que incluem requisitos de tamanho, liquidez e histórico de lucros, com acompanhamento de um comitê que zela pelo índice. Em termos simples, entram empresas grandes, líquidas e lucrativas — e saem as que deixam de atender a esses padrões. Esse desenho explica por que o índice consegue capturar as forças dominantes da economia americana sem depender de “apostas” discricionárias.
Historicamente, o S&P 500 entregou retorno médio anualizado na casa de 10% em dólares quando consideramos o reinvestimento de dividendos, ao longo de quase um século de dados. Esse histórico inclui períodos de crise e recuperação, mas, no agregado, o prêmio de risco acionário americano se mostrou persistente, o que justifica seu papel como pilar de uma carteira global de longo prazo.
Desse retorno, cerca de 3,5 p.p. veio de dividendos reinvestidos, não apenas da alta dos preços, razão pela qual a eficiência tributária ao capturar esses proventos (como na estrutura irlandesa) faz diferença real no resultado acumulado. Ignorar os dividendos é subestimar o motor de composição de longo prazo do índice.
Outro ponto central: gestores ativos têm enorme dificuldade em superar o S&P 500 de forma consistente. Nos Estados Unidos, o relatório SPIVA (S&P Indices Versus Active), publicado semestralmente, mostra que a maioria dos fundos de ações large cap fica atrás do índice nos horizontes longos: cerca de 90% dos fundos tiveram performance inferior ao S&P 500 nos períodos de 10, 15 e 20 anos encerrados em 2024. Em outras palavras, “tentar bater o índice” é a exceção, não a regra, quando olhamos janelas de investimento relevantes.
Fonte: S&P Global. Data base: 31/12/2024
Outras leituras independentes chegam à mesma conclusão: o Active/Passive Barometer da Morningstar encontra taxas de sucesso persistentemente baixas dos gestores ativos de ações dos EUA quando se estende o horizonte de análise, reforçando que custos e consistência pesam contra a superação do benchmark no longo prazo. Para o investidor final, isso sugere que a via mais racional costuma ser obter exposição direta e eficiente ao índice — e otimizar aquilo que está sob seu controle: custos, impostos e disciplina de reinvestimento.